Construa comigo uma imagem mental das dimensões do cosmo
PEDRO LUNA
Eu sempre adorei astronomia. Desde pequeno me lembro de olhar fascinado uma coleção de livros da revista Life que meu pai comprou, com fotos de estrelas e galáxias. Era o início dos anos 1970, o homem já havia pisado na Lua, o universo era fascinante, inescrutável e em preto e branco. Foi só a partir de 1990, com o lançamento do telescópio espacial Hubble, que as estrelas ganharam cores deslumbrantes. Foi quando descobriu-se que aquelas nebulosas distantes não eram nuvens de pó interestelar incolor, e sim que reluziam com todas as cores do espectro.
Ainda menino, fascinado com a beleza monocrômica do espaço, comecei a tentar conceber as distâncias que nos separavam das estrelas. Naquela época, li que a Via Láctea, a nossa galáxia, é uma espiral com 100 bilhões de estrelas (hoje estima-se que são 400 bilhões) com um diâmetro de 100 mil anos-luz. É impossível imaginar o que isto significa. Confesso que, aos 12 anos, tentei fazê-lo. Eu queria imaginar o que significariam os 100 mil anos-luz do diâmetro da Via Láctea para, a partir deste cálculo, tentar imaginar o tamanho do universo.
A teoria do Big Bang reza que o universo surgiu de uma explosão primordial que lançou matéria e energia em todas as direções. Com o passar das eras, matéria e energia começaram a formar galáxias e estrelas. Quando eu era criança, a idade do universo ainda era incerta. Lembro que meus primeiros cálculos mentais foram feitos com base num universo surgido há 20 bilhões de anos - o que se acreditava na época (hoje se sabe que o Big Bang se deu faz 13,7 bilhões de anos).
O universo é tão antigo e suas escalas de distância são tão deslocadas da nossa realidade, que se tornam incompreensíveis. Não é possível imaginar o que são 13,7 bilhões de anos. Mas é possível conceber analogias que nos aproximem - se não de uma resposta -, pelo menos de um significado plausível.
Como imaginar o tamanho da Via Láctea?
A unidade de distância astronômica é a velocidade da luz, ou seja, 299.792,49 km/s, que se convencionou arredondar para 300 mil km/s. É muito. A nave espacial mais veloz construída pelo homem é a sonda americana Voyager I. Lançada em 1977, ela se encontra neste momento além da órbita de Plutão, na porta dos fundos do Sistema Solar. Sua velocidade é 17,46 km/s. Ou seja, a Voyager I cobriria os 446 km que separam São Paulo do Rio de Janeiro em 25 segundos. Tal velocidade empalidece diante daquela da luz, 17 mil vezes mais veloz.
Basta um segundo para a luz completar 7,5 voltas em torno da Terra. O Sol fica a 150 milhões de km daqui. A luz leva 8 minutos e 18 segundos para cobrir essa distância. Se o Sol explodisse neste exato instante, a explosão só seria visível daqui 8 minutos – e seria a última coisa que qualquer um de nós assistiria, pois a Terra deixaria de existir.
É quando olhamos o céu noturno pontilhado de estrelas que as coisas começam a ficar realmente assombrosas. Quão longe elas estão? De todas as estrelas no céu, a mais próxima é, como o nome indica, Próxima Centauri, a 4,2 anos-luz de distância. A mesma luz que dá 7,5 voltas na Terra em um segundo precisa de 4,2 anos para cobrir a distância que separa Próxima Centauri do Sol. Daí se conclui que a luz de qualquer estrela que observamos à noite levou, NO MÍNIMO, 4,2 anos até chegar à nossa retina.
Agora começa-se a adentrar nas dimensões cósmicas. Aqui, a unidade básica é o ano-luz, a distância que a luz percorre em um ano, ou 9,46 trilhões de quilômetros. Este número é tão grande que, para todos os efeitos, não tem significado algum. Pode esquecê-lo. Nossa unidade é o ano-luz.
Sabemos que a Via Láctea é uma imensa galáxia em espiral com um diâmetro de 100 mil anos-luz. Ou seja, a luz emitida por uma estrela em uma extremidade leva 100 milênios para atingir a outra extremidade. Há 100 mil anos, nossa espécie, o Homo sapiens, ainda se encontrava confinada na África.
Andrômeda, irmã gêmea da Via Láctea, é a galáxia em espiral mais próxima da nossa. Ela está a 2,5 milhões de anos-luz de distância. Ao usar um telescópio para observar Andrômeda, o que se vê é a luz que saiu dela quando a nossa ancestral Lucy e a sua espécie, a Australopithecus afarensis, viviam tranquilos na África, sem sonhar que, de sua linhagem, evoluiriam um dia primatas capazes de ir à Lua.
Como imaginar o tamanho do universo?
Agora que sabemos que a Via Láctea mede 100 mil anos-luz, estes 100 mil anos-luz da como se sendo apenas e tão somente um centímetro do metro de uma trena cósmica. Nesse caso, Andrômeda estaria a 25 cm de distância. Não parece tão longe quanto antes, parece?
Longe mesmo são os confins do universo. O universo surgiu há 13,7 bilhões de anos, logo as primeiras radiações emitidas deveriam estar a 13,7 bilhões de anos viajando em todas as direções. Se imaginarmos o universo como um balão de festa que vai enchendo na medida em que se sopra nele, 13,7 bilhões de anos-luz é o raio do balão. Como o diâmetro é o dobro do raio, o diâmetro do universo deve estar em cerca de 27,4 bilhões de anos-luz, certo?
Errado. O cosmo é muito maior. A distância que nos separa da fronteira cósmica seria de 13,7 bilhões de anos-luz apenas e tão somente se o universo estivesse se expandindo à velocidade da luz desde o Big Bang. Não está. Hoje se sabe que a expansão está acelerando. O espaço entre as galáxias está aumentando de forma acelerada. E as galáxias distantes estão se afastando de nós a velocidades superiores às da luz.
Ninguém sabe explicar o porquê desta aceleração, então vamos nos limitar a avaliar as suas consequências. Segundo os cálculos dos astrônomos, o limite dos universo observável encontra-se a 46,6 bilhões de anos-luz. Decorre daí que o universo tem hoje um diâmetro de cerca de 93,2 bilhões de anos-luz
Retomemos agora a nossa trena e vamos tentar entender o que isto significa. Se os 100 mil anos-luz da Via Láctea correspondem a um centímetro da trena cósmica, quanto seria 93,2 bilhões de anos-luz? A conta é fácil, embora cheia de zeros. O diâmetro do universo é 940 mil vezes maior que o da Via Láctea. Convencionamos que o comprimento da nossa galáxia é um centímetro, certo? Então o diâmetro do universo é 9,4 km.
O universo pode ser imaginado como uma esfera em expansão com diâmetro de 9,4 km. No interior da esfera estão as 400 bilhões de galáxias do universo visível, cada qual com uma média de 100 bilhões de estrelas e incontáveis planetas.
E o que existe além das fronteiras do universo visível? Ninguém sabe. Mas suspeita-se que possam existir outros universos, todos imersos no interior de um multiverso, esse sim, eterno e infinito.
“O universo é um lugar muito, muito grande”, lê-se no romance Contato (1985), de Carl Sagan. “Se só existisse vida aqui na Terra, então o universo seria um enorme desperdício de espaço.” Não consigo imaginar afirmação mais verdadeira.
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